sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Escrever.

"Se você quer ser compreendido, escute." em Babel, filme de Alejandro Gonzalez Iñárritu

Se você quer escrever bem, leia.


Em um diálogo, temos condições de mudar as sentenças, abortar frases, blabuciar palavras, reexplicar-se, voltar atrás. Em um diálogo gesticulamos. Construímos, ou tentamos construir, a cada instante um textoque possa ser compreendido por quem nos escuta.

Pelo menos, acreditamos que nos estamos fazendo compreender. Muitas vezes, esse não é o caso. Achamos que fomos compreendidos, mas logo percebemos - pelas reações e comentários de quem nos ouve - que o cerne da idéia foi perdido. Isto ocorre principalmente porque o ato de dialogar compreende também o escutar. O destinatário envia constantemente sinais que podem auxiliar a guiar o diálogo, levando ao entendimento. Contudo, tão embuídos somos cada um de nós em nossos próprios mundos, que somos muitas vezes incapazes de reconhecer a mensagem que nos é destinada e que auxilia a guiar nossas próprias palavras. Abrir-se para o outro, captar-lhe gestos, palavras e intenções ajuda a fazer com que nós mesmos sejamos compreendidos na medida em que podemos mais rapidamente mudar a estrutura ou intenção do diálogo, adaptando-o ao seu contexto e às pessoas que nos ouvem. Neste sentido, às vezes, é nosso desejado silêncio aquele que mais contribui para que o diálogo entre nós e os demais se desenvolva satisfatoriamente.

Ao escrevermos um texto, essa contemporaneidade é perdida. Não há mais possibilidade de mudar aquilo que escrevemos a cada instante, nem de ler a mensagem do leitor para adaptar o texto às suas necessidades. Não existe a possibilidade de interagir direta e imediatamente com quem nos escuta. Em princípio, podemos ter idéia de quem será o leitor de nosso texto, pois determinados assuntos e a forma como são abordados cativam o interesse de um determinado público (imagine textos em diversas revistas e quem se interessa em lê-las). Naturalmente, isso ajuda a escrever o texto. Contudo, devemos nos lembrar que o autor não estará presente para explicar o que determinado trecho do texto significa. Tampouco será possível modificá-lo segundo a reação de quem o lê.

Por isso, uma vez escrito, o texto deverá ser auto-suficiente. Ele deve bastar-se a si mesmo para que possa ser compreendido. O leitor deve ser capaz de caminhar pelas veredas do texto livremente e o texto deve fornecer todos os elementos para que isto aconteça, fornecendo a linguagem e a argumentação necessárias para que o leitor siga seu caminho sem perder-se. É responsabilidade do texto - e portanto do autor - cirar condições para isto ocorra.
Para que um autor assim se exprima, seu trabalho começa já antes do ato de escrever. Começa com outros textos. Começa com o aprender a dialogar (no sentido descrito no início deste texto). Sem o hábito de ler (e de dialogar com os textos que lê), muito dificilmente uma pessoa conseguiria escrever de forma clara e proveitosa.

Ler, no sentido de dialogar com o texto, não significa somente passar os olhos decifrando palavras, apreendendo seu significado mais imediato. Ler, em sentido mais amplo, é reconhecer no mundo, interagindo com o que se desdobra diante de nossos olhos. É descobrir o mundo, assim como descobrimos olhando ao nosso redor, novos aspectos a cada instante, mesmo se que olhemos sempre para uma mesma paisagem. Ler é interagir com o texto, compreendendo-o, contextualizando-o, percebendo suas nuances, suas entrelinhas, tomando posição frente a sua mensagem, imaginando em que sentido esta tem ou não a ver com sua vida.

"Se você chorar [lendo um texto], tenha orgulho de si mesmo,
pois você foi capaz de liberar a dor e aliviar seu coração,
abrindo novas possiblidades de crescimento e aceitação"
(adaptação a partir de um antigo texto yogui)

A partir do momento em que conseguimos ler interagindo com o texto, percebendo até que ponto ele pode influenciar nossa vida e o modo como enxergamos o mundo, quando podemos criticar construtivamente o que lemos, então estamos preparados para escrever.

Para começar a escrever, e escrever bem, a segunda regra é a prática. Com a prática nos acostumamos a ler nosso texto com os olhos de um leitor, antes que outra pessoa tenha acesso a ele. Isso faz com que possamos modificá-lo, deixando mais clara a argumentação para que o texto seja auto-suficiente.

Para isso, é necessário manter a atenção em dois aspectos: primeiro, escrever de forma direta e fácil, evitando frases longas e confusas, tentando abordar um assunto de cada vez (segundo o tópico frasal de casa oração) e, segundo, explorar cada assunto ao máximo. Para isso serve o tópico frasal, que é sempre a primeira sentença de uma oração e que guia o conteúdo desta. Por exemplo, se a primeira frase desta oração versa sobre escrever de forma direta e fácil, devemos nos abster de fazer outros comentários que não os indicados nesta frase. Se mantivermos o texto centrado em cada um dos tópicos frasais a cada parágrafo, conseguiremos criar um texto mais organizado e cuja argumentação será explorada, em cada um deles, sem repetições ou confusão (idas e vindas entre diversos argumentos).

Outro aspecto que pode deixar o texto melhor é ter coragem de jogar fora frases (ou idéias) de efeito, bonitas, que nos são caras, mas que não servem ao texto. Eliminando frases que não ajudem a elucidar a argumentação do texto, podemos expor mais rápida- e claramente o assunto. Menos muitas vezes é mais.

Para finalizar, temos de ter em vista os conectores entre as idéias, por isso, estudar as conjunções e frases que sirvam para unir idéias (mesmo contrapondo-as) é importante. Muitas vezes o texto está bem escrito, mas a união entre duas idéias contraditórias com uma conjunção errada compromete o entendimento do que quer ser dito e portanto invalida a argumentação utilizada.

Para aprender a escrever, o melhor profesor é você mesmo. Aprenda a dialogar, escutando o que as pessoas têm a dizer. Aprenda a ler, compreendendo o texto com o coração aberto e pratique escrevendo todos os dias. Logo, criar um texto será como respirar... necessário e fácil.

http://www.art.net/~vision/dov2J.html